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O Homem de Giz ♥ C. J. Tudor

Resenha O Homem de Giz de C. J. Tudor da Editora Intrínseca

Um homem feito de giz, tal qual os desenhos infantis que brotam nas calçadas das casas das crianças que trocam mensagens secretas. Um triller que composto do pó de giz, do sangue e dos destroços do passado. O Homem de Giz de C. J. Tudor é o primeiro lançamento da Intrínseca da autora e garante muitos mistérios.

O Homem de Giz (The Chalk Man)
C. J. Tudor
Tradução Alexandre Raposo
2018 / 272 páginas
Intrínseca
Disponível na Amazon
“Acho que foi a primeira vez que compreendi como as coisas podem mudar de uma hora para outra. Como tudo o que temos por certo pode ser arrancado de nós. Talvez seja por isso que peguei aquilo. Para ficar com alguma coisa. Para manter aquilo em segurança. Ao menos foi o que disse para mim mesmo.”
Sobre C. J. Tudor

C.J. Tudor nasceu em Salisbury e cresceu em Nottingham, Inglaterra, onde ainda mora com a família. Seu amor pela escrita, especialmente pelo estilo sombrio e macabro, surgiu logo cedo. Enquanto os colegas liam Judy Blume, ela devorava as obras de Stephen King e James Herbert. Ao longo dos anos, atuou em várias funções, como repórter, redatora, roteirista para rádio, apresentadora de televisão, dubladora, passeadora de cães e agora escritora. O Homem de Giz é seu romance de estreia, já tendo publicado no Brasil, também pela Intrínseca, O Que Aconteceu com Annie e As Outras Pessoas (esses dois últimos, primeiramente pelo Intrínsecos).

Sinopse

Em 1986, Eddie e os amigos passam a maior parte dos dias andando de bicicleta pela pacata vizinhança em busca de aventuras. Os desenhos a giz são seu código secreto: homenzinhos rabiscados no asfalto; mensagens que só eles entendem. Mas um desenho misterioso leva o grupo de crianças até um corpo desmembrado e espalhado em um bosque. Depois disso, nada mais é como antes.

Em 2016, Eddie se esforça para superar o passado, até que um dia ele e os amigos de infância recebem um mesmo aviso: o desenho de um homem de giz enforcado. Quando um dos amigos aparece morto, Eddie tem certeza de que precisa descobrir o que de fato aconteceu trinta anos atrás.

Alternando habilidosamente entre presente e passado, C. J. Tudor traz em O Homem de Giz, o melhor do suspense: personagens maravilhosamente construídos, mistérios de prender o fôlego e reviravoltas que vão impressionar até os leitores mais escaldados.

Resenha de O Homem de Giz de C. J. Tudor publicado pela Editora Intrínseca
O Homem de Giz

É bem provável que você já tenha desenhado ao menos um boneco palito na sua vida. Talvez num rabisco no caderno, talvez para brincar de forca. Giz? Bem sabemos que ele não serve apenas para escrever no quadro negro e jogar na cabeça dos colegas. Quem nunca fez um risco sequer com ele?

Estamos em 1986 e os amigos Eddie Monstro, Mickey Metal, Gav Gordo, Hoppo e Nicky, a única menina do grupo, também fizeram seus desenhos de giz nas calçadas de suas casas para trocar recados entre eles.

O detalhe é que esses mesmos bonequinhos serão usados para algo bem mais macabro: indicar a localização de um corpo.

“A gente cuida dos amigos, Eddie Monstro – disse ele certa vez, solenemente. – Os amigos são tudo.”

Um salto no tempo e estamos em 2016, o clube dos cinco se desfez e apenas Ed, Gav e Hoppo (agora lembrado por seu nome, David) são os únicos que ainda vivem na cidadezinha dos eventos macabros de 1986. Afinal, não é todo dia que um grupo de crianças encontra um corpo desmembrado.

O Ed de 2016 quer manter tudo o mais enterrado possível, mas o retorno de Mickey promete desenterrar muitas coisas escondidas: algumas delas as quais algumas pessoas podem querer manter soterradas a qualquer custo.

A narrativa segue indo e voltando de 1986 para 2016 e, a medida que avançamos na narrativa, vamos formando o panorama que compôs o passado e imaginando o que está prestes a ser revelado no futuro, já que alguns acontecimentos de 1986 foram, se dúvidas, encobertos por saídas fáceis.

“Há certas coisas na vida que se pode alterar – o peso, a aparência, até o próprio nome -, porém há outras que são imutáveis, independentemente da força de vontade, do esforço e do trabalho árduo. São estas coisas que nos moldam: não as que podemos mudar, mas as que não podemos.”
Resenha de O Homem de Giz de C. J. Tudor publicado pela Editora Intrínseca

Seguimos com Ed, o protagonista, entre esses dois tempos, conhecendo-o primeiro como o garoto que tem um costume estranho de colecionar todo tipo – todo mesmo – de coisa. Mas que, no fim das contas, atualmente, vive sozinho na casa que já foi de seus pais e se tornou um âmago de memórias sombrias e remorsos.

Nicky, a única garota do grupo, se mudou ainda em 86 e não se tem notícias; Mickey está fazendo sucesso em algum lugar, com a língua afiada que tinha, algum bom uso ia lhe render; Gav comanda um bar local e David, bem, já chego nele.

A volta de Mickey gera o que se espera: passado remexido. Algumas antigas mágoas e desavenças são trazidas à tona e a narrativa vai criando vários mistérios, tanto no presente quanto passado, que nos faz passar as páginas com rapidez: o livro aqui foi devorado em duas sentadas, por assim dizer.

“Pessoalmente, descobri que é muito melhor pegar nossos medos, trancá-los em uma caixa bem fechada e guardá-los no canto mais profundo e escuro da mente. Mas cada um sabe de si.”
O Homem de Giz: contradições, pontas soltas e personagens pouco explorados

A construção do suspense se sustenta em alguns pontos, mas em outros as resoluções ficam um tanto quanto subtendidas à nossa imaginação. Ainda assim, ficamos curiosos nos dois lados da história, ainda que às vezes dê vontade de pular os capítulos que se intercalam pra continuar no gancho do passado e não alternar para o futuro.

Mas a história também tem alguns pontos que incomodam. Algumas cenas trágicas parecem ter sido feitas pelo mero choque, já que analisando, não fazem diferença no livro.

Além disso, alguns (vários) personagens são mal aproveitados, como David/Hoppo, tanto na infância quanto adulto, mal sabemos dele (lembra que não disse o que ele faz? Pois é, a sensação é que com ou sem ele, a história seria a mesma). Nicky também, tem um passado bem pesado e, no ‘futuro’, quem é mesmo ela? Sua aparição é irrelevante e qualquer outro meio poderia dar a informação que ela traz à trama. Sem contar que, no geral, a versão geral dos personagens dos anos 80 é bem estereotipada.

“Ter princípios é algo bom. Se você puder bancá-los. Gosto de pensar que sou um homem de princípios, mas, no fim das contas, a maioria dos homens acha que é. O fato é que todos temos um preço, todos temos botões que podem ser pressionados para nos levar a fazer coisas que não são de todo honradas. Princípios não pagam a hipoteca nem quitam nossas dívidas. Princípios são uma moeda sem valor na rotina do dia a dia. Em geral, um homem de princípios é alguém que tem tudo o que quer ou não tem absolutamente nada a perder.”

Mas a picada primordial, que me deu vontade de ir tirar satisfação com a C. J. Tudor é uma desavença linguística que achei inicialmente que poderia ser um problema de tradução da versão brasileira de O Homem de Giz. Mas não é. Conferi no e-book em inglês e, não, não é uma questão de tradução. E uma informação, no fim, acaba sendo contraditória à outra.

Uma coisa que eu prezo muito nas minhas leituras é a regra de não trapacear o leitor e toda vez que leio um livro que faz isso, ele cai bastante no meu conceito. Não é aquela ideia de te enganar e depois, te mostrar que você é que foi lerdo e não viu tudo que estava sendo mostrado: adoro ser feita de boba nesse caso, assino meu papel de trouxa com satisfação (um livro que fez isso comigo de forma brilhante foi A Paciente Silenciosa, que até hoje não foi superado).

Mas, quando existem elementos contraditórios ou coisas que não se justificam, que não tem embasamento dentro da trama, não, o papel de trouxa não será assinado. O caso de O Homem de Giz é um detalhe que talvez passe despercebido, mas como envolve um dos mistérios da trama, ficou bem marcado na minha memória e, quando li, voltei nas partes para checar. C. J. Tudor, você não me enganou!

“A morte acontecia com outras pessoas, não com crianças como nós, não com pessoas que conhecíamos. A morte era abstrata e distante. O enterro […] provavelmente foi a primeira vez que compreendi que a morte está apenas a um frio e azedo ofegar. Seu maior truque é nos fazer pensar que ela não está ali. E a morte tem muitos truques sob sua manga fria e escura.”
C. J. Tudor e a influência de Stephen King

Um ponto que sempre surge nas discussões sobre os livros da C. J. Tudor é a semelhança com as obras de Stephen King, que a autora assumidamente é fã (semelhança que alguns dizem beirar o plágio). Mas a questão é que, mesmo sem ler It, a Coisa, do King, tendo visto os dois últimos filmes da obra (que pelo opinião geral que vi segue razoavelmente o enredo do livro), o que temos aqui são várias semelhanças, que me incomodaram no começo da leitura.

O grupo de amigos, a forma como são apresentados, a vibe oitentista, apenas uma garota ruiva entre eles (com pai abusivo), a transição entre passado e presente, o foco em um grupo de amigos crianças e suas vidas posteriores; o protagonista perdido… São vários detalhes que fazem sim pensar na obra de King, até características físicas e de personalidade dos personagens são muito próximas, e especialmente no começo do livro, senti que muitas referências estavam espalhadas.

“O refrão diz que ninguém é lembrado pelo que não fez. Mas isso não é de todo verdade. Minha vida foi definida pelas coisas que não fiz, pelas coisas que não disse. Acho que o mesmo acontece com várias pessoas. Nem sempre o que nos molda são as nossas realizações, e sim as nossas omissões. Não necessariamente as mentiras, apenas as verdade que não dizemos.”
Resenha de O Homem de Giz de C. J. Tudor publicado pela Editora Intrínseca

Confesso que achei um tanto quanto desnecessário, como a configuração do grupo de amigos, descrição de características físicas, porque, afinal, não foram pontos decisivos na trama. Mas, ao mesmo tempo, quem sabe, essa seja a forma que a autora escolheu para homenagear o mestre.

No fim, O Homem de Giz é, sem dúvidas, uma leitura que flui com rapidez, a escrita ágil de C. J. Tudor garante isso, te prendendo e fazendo surgir a curiosidade a todo tempo. Mas também, o livro peca em alguns aspectos que tiram um pouco do seu crédito, especialmente no que diz respeito à construção dos personagens, às pequenas pontas soltas e à contrariedade que acaba caindo.

“Afinal, quem somos nós além da soma de nossas experiências, das coisas que aprendemos e colecionamos ao longo da vida? Sem isso não passamos de um conjunto de pele, ossos e vasos sanguíneos.”
Resenha O Homem de Giz de C. J. Tudor da Editora Intrínseca
Aleatoriedades
  • O Homem de Giz da autora C. J. Tudor foi recebido em parceria com a Editora Intrínseca!
  • Para ler a resenha do outro livro da autora, O Que Aconteceu com Annie, primeiramente lançado pelo Intrínsecos, é só clicar aqui!
  • As fotos da vez pede o uso da imaginação pra considerar que esses Funkos (Stevie de Stranger Things; Cady de Meninas Malvadas; Ferris Bueller de Curtindo a Vida Adoidado; Kristoff de Frozen; e Marty MacFly de De Volta para o Futuro) representa as cinco crianças que fazem parte da história.

Que a Força esteja com vocês!

xoxo

Retipatia
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