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Royal City: segredos em família ♥ Jeff Lemire

Resenha da Graphic Novel Royal City, de Jeff Lemire, publicado em 2020 pela Intrínseca.

Royal City: segredos em família traz um drama familiar repleto de memórias, rancores, sentimentos e pesares. A história em quadrinhos irá lhe perguntar o quanto uma perda pode afetar uma família e o quanto nosso passado pode afetar nosso presente, nosso futuro. Talvez as respostas estejam em suas páginas, talvez, alguns fantasmas sejam difíceis de deixar ir.

Royal City: segredos em família (Royal City – Vol. 1: Next of Kin)
Jeff Lemire
Tradução de Fernando Scheibe
Intrínseca | 2020 | 160 pág.
Disponível em Amazon
“Até que ponto todos os nossos erros se tornam um fardo que nos impede de seguir em frente?”
Sobre Jeff Lemire

Jeff Lemire é autor e ilustrador canadense. Entre suas principais obras estão O soldador subaquático e a trilogia Condado de Essex. Foi eleito duas vezes melhor quadrinista do Canadá pelo Schuster Award e venceu o Eisner Awards pela série Black Hammer. Além de suas graphic novels independentes, passou por grandes editoras norte-americanas, como Marvel e DC, onde atuou em séries como Arqueiro VerdeConstantineCavaleiro da Lua, entre outras.

Resenha da Graphic Novel Royal City, de Jeff Lemire, publicado em 2020 pela Intrínseca.
Sinopse de Royal City: segredos em família

Há algo diferente em Royal City, uma estranheza que parece envolver tudo e todos. É nessa cidade outrora próspera que mora a família Pike, dilacerada desde a misteriosa morte do caçula, Tommy, décadas antes. Desde então, os Pike são assombrados por esse fantasma, que aparece para cada familiar de uma forma, seja como o menininho ingênuo, o homem casto, o adolescente revoltado ou o beberrão inconsequente.

Quando o pai sofre um derrame, Patrick Pike, um escritor em crise, volta a contragosto para a cidade e para as lembranças das quais tanto quis fugir. Ele logo se vê mergulhado nos segredos e problemas da família, e seu encontro com Tommy pode ter consequências devastadoras.

Com toques de realismo fantástico e mistério, Royal City: Segredos em família reúne os cinco primeiros fascículos de uma saga urbana sobre uma família em colapso e sobre os traumas e as memórias que o passado não conseguiu enterrar.

Resenha da Graphic Novel Royal City, de Jeff Lemire, publicado em 2020 pela Intrínseca.
Royal City: segredos em família
“Às vezes me pergunto se foi difícil crescer em Royal City… ou se foi simplesmente difícil crescer. É que tem algo diferente neste lugar. Juro que dá para sentir isso tarde da noite, uma estranheza que parece envolver tudo. Algo que te deixa acordado e te faz se sentir ainda mais sozinho. Ou talvez seja isso mesmo: estou completamente sozinho. Será que sou o único pensando nessas coisas estúpidas o tempo todo?”

Qual versão de nós é real, aquela que temos sobre nós mesmos ou aquela que cada pessoa que nos conhece, é capaz de ver?

Em Royal City, uma cidade decadente na qual já é difícil reconhecer o brilho de outrora, vive a família Pike. E essa é a história dessa família. De cada um de seus membros da árvore genealógica, que estão ligados, não tanto pelo laço sanguíneo, mas muito mais pelo fio da dor que carregam.

Resenha da Graphic Novel Royal City, de Jeff Lemire, publicado em 2020 pela Intrínseca.

Patrick Pike é um escritor, também decadente, que volta a Royal City quando seu pai sofre um derrame. Sua volta, assim como o derrame do pai, são como um sopro forte de vento em meio à uma casa empoeirada. O desconcerto que é desencadeado em cada um dos Pike não é apenas pela poeira levantada, mas muito mais pelo que é revelado, pelo que estava escondido pela grossa camada acinzentada.

“Agora, quando venho para casa, me sinto preso entre duas pessoas. Um estranho híbrido do homem que com tanto esforço me tornei e da pessoa que com tanto esforço enterrei no passado. Mas não sou o mesmo das memórias deles, e isso cria um vazio dentro de mim. É como se estivesse aqui, sem de fato estar. Ando pela casa onde cresci como um mecenas num museu. Ou como um fantasma.”

O fio em comum, a dor em comum dos personagens tem a ver com a morte prematura de Tommy, o caçula. E, cada um dos Pike tem sua própria versão de Tommy para carregar. Um fardo que parece pesar as ações, decisões, toda a vida deles desde a tragédia.

Resenha da Graphic Novel Royal City, de Jeff Lemire, publicado em 2020 pela Intrínseca.

Nesse meio de apresentações dos muitos Tommys, vamos conhecendo quem é Patrick, seu pai Peter, sua mãe Patti, o irmão Richard e a irmã Tara. São todos peças de um quebra-cabeças que nunca ficará completo.

Adentrar as páginas de Royal City é entrar na mente de alguém, ou de vários alguéns. É ver a dor misturada ao rancor, ao ódio, ao remorso. É um misto de café amargo com uma tragada num cigarro barato. Causa arrepio não na pele, mas no sentir. Ver o quanto as amarras que nos prendem são trançadas por nossas mãos, as chaves dos cadeados que nos pesam, jogadas no rio por nossa própria sombra.

“Os fantasmas de quem éramos estão sempre assombrando quem somos hoje, e no centro disso tudo está 1993. O maldito ano de 1993. O ano que nunca nos libertará… nunca nos deixará seguir em frente.”
Resenha da Graphic Novel Royal City, de Jeff Lemire, publicado em 2020 pela Intrínseca.

A dor da perda aqui se estende para além do luto, vai até as entranhas dos personagens, mantido a duras penas, para que nunca cicatrize, mantendo-os, de certa forma, parados no tempo. Presos em 1993.

Cada uma dessas versões de Tommy, que acompanham os familiares, reflete muito mais quem são Patrick, Peter, Patti, Richard e Tara do que quem foi o pequeno Tommy. São ecos do passado que os prende não apenas à cidade, mas à sua decadência de espírito.

E por isso não existem os arquétipos de vilões e heróis. É a boa e velha vida se mostrando presente, sonhos despedaçados, conflitos, ranhuras. Os relacionamentos explorados, as dores mostradas podem fazer o leitor olhar para suas próprias dores, apreensões, feridas, perdas. Para sua própria vida. Não como uma história em que certo e errado estão salpicados de neon para indicar a resposta certa, mas bem mais como o mundo gira, com nuances de ideais, de verdades, de vivências que são conflitantes, sem necessariamente, estarem certas ou erradas. Não existe dicotomia bem versus mal, a vida é escrita muito mais por nossos passos do que pela crença que nos fez seguir adiante.

“Com que idade estamos velhos demais para começar do zero?”

A narrativa de Jeff Lemire nos leva bem mais do que pelas ruas de Royal City, bem para além de segredos familiares que foram guardados a sete chaves. Ela nos traz um fio único, conectando todos os personagens, mas mostrando cada um deles, em sua própria particularidade. Um roteiro inteligente e salpicado de sentimentos.

Em Royal City fantasmas são reais, feitos de memórias e rancor e vestem várias idades de um único ser. Mas não se preocupe, eles não estão aqui para assustar ou assombrar no meio da noite. A não ser, é claro, que você seja um Pike.

Aleatoriedades

A HQ Royal City: segredos em família foi recebida em parceria com a Editora Intrínseca.

Para quem quiser conhecer mais HQ’s e o trabalho de Lemire, recomendo muito Descender: estrelas de lata, em que ele foi cocriador no projeto de Dustin Nguyen. Agora se curte o lado drama familiar, Oblivion Song de Robert Kirkman e Lorenzo de Felici também pode ser uma boa leitura.

E já que estamos falando de dramas familiares, não posso deixar de lado dois romances favoritos da vida: O Construtor de Pontes do Markus Zusak e A Casa Holandesa da Ann Patchett.

Que a Força esteja com vocês!

xoxo

Retipatia
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  • Angela Cunha

    Eu sabia que encontraria o encanto de suas fotos em totalidade aqui! Não somente por estar apaixonada por Graphic’s, mas por sentir todo o drama entregue em cada ilustração.
    Ainda não li nada de Lemire, mas preciso, afinal elogios aos seus trabalhos não faltam!!!
    Obrigada por sempre me deixar feliz com suas fotos tão delicadas e caprichadas!!!
    Beijo

    Angela Cunha/O Vazio na flor

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