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Conto ♥ Carnis Levale – Parte II

Este conto é continuação de Carnis Levale, publicado no último Carnaval, aqui no blog. É possível a compreensão deste sem a leitura do primeiro, ainda assim, ela é recomendada de forma prévia. Se quiser ler a primeira parte primeiro, clique aqui

Talvez eu não estivesse com essa sensação de quem a maresia fez mal se meus planos de não nos falarmos a sós tivesse sido bem-sucedido.

Quero dizer, quase foi. Até a noite de ontem, quando Alexandre me encontrou sozinha a bebericar o vinho do jantar.

– Seria apenas impressão minha, ou você tem evitado ficar a sós comigo?

Quando ouvi suas palavras, fiz questão de tomar todo o conteúdo da taça, talvez esses míseros segundos fossem capazes de me dar tempo para pensar, em exatamente o que, eu não faço ideia.

– Não posso dizer que é mentira.

Seu sorriso aparece, mas não se estende até seu olhar. Desvio o meu até a porta da cozinha, na esperança de que alguém entre e interrompa qualquer direcionamento infeliz que essa conversa possa tomar. Decididamente, o álcool me deixa estúpida.

– Dance comigo amanhã.

Olho de relance para ele enquanto encho minha taça novamente, como se não pudesse optar por dar alguns passos e sair da cozinha.

– Já tenho um par, Alex. – Seu nome já foi reduzido na minha boca, desde que minha empresa fechou negócios no último ano com a dele. O pior é que meu marido o considera um excelente amigo, como se a relação dos negócios já não me fosse um incômodo suficiente.

– Não me dê respostas vazias, seu parceiro pode ser dispensado. É apenas uma noite, Gio, você mesma disse. – Disse? A pergunta chega às minhas expressões e ele apenas assente com a cabeça, parado agora bem próximo de mim, seu perfume impregnando todo o ar ao meu redor. A vontade de laçá-lo em meus braços e…

– Não terminou muito bem da última vez, Alex.

– Eu tenho uma definição bem diferente sobre o que é terminar bem

Um sorriso aparece como penetra em minha boca, com certeza culpa do álcool. Mas é estupidez e não burrice o que o líquido me traz e já o fiz muito mais do que deveria da última vez. Não irá se repetir.

– Adoraria dançar novamente com você, Alex. – Repouso minha mão no seu ombro e seu sorriso de quem acaba de ganhar na loteria aparece. – Mas nem tudo que eu adoro me é permitido fazer. Irei dançar amanhã à noite com meu parceiro habitual enquanto meu marido dorme o sono dos justos na nossa cama. Sem preocupações, assim como eu preciso ficar.

– Tem certeza, Gio? Não serei uma preocupação, prometo. – Toco seus lábios com a ponto do indicador, estão entreabertos, irresistíveis. Beijo por cima do toque do meu dedo e sinto seu hálito de vinho quando há um quase roçar de nossos lábios.

– Se não for assim, é o que vai se tornar, Alex.

Deixei-o na cozinha e agora, enquanto termino de me vestir para ir dançar com Eric, tudo que me vem à cabeça é como eu queria ter…

– Está linda, minha Gio. – Os braços de Arthur cruzam minha cintura e seu reflexo de pijamas se junta ao meu no espelho.

Fecho os olhos e sorrio com a imagem em minha mente, sentindo a ponta de seu nariz roçar a pele desnuda de meu pescoço e seus lábios resvalarem em leves beijos.

– Assim não vou conseguir sair de casa. – Arthur sorri e dá um beijo mais demorado ao pé de minha orelha.

– Eu não acharia nem um pouco ruim… – Ele diz rindo e me vira para ele. – Está deslumbrante, será a mulher mais bonita, irresistível e incrível daquele salão.

Sorrio e seguro seu rosto entre minhas mãos.

– Tire esse pijama e venha comigo. Dance comigo. – Sua careta, típica de quem tomou um gole amargo de bebida, surge.

– Ah, de jeito nenhum, sabe como detesto essas festas. – Sei que é uma guerra perdida, já lutei tantas batalhas por causa disso… Com um beijo suave em meus lábios, suas mãos seguram as minhas como em despedida. – Divirta-se, dance muito. Amanhã prometo que o dia será apenas nosso.

Em segundos ele está na janela, me informando que a limo me espera do lado de fora. Sigo os passos rotineiros e anuais. Sigo para a fiesta. A ode à luxúria. Até o ano passado, meu indócil desejo era amainado com a dança, com o exibir-me em frente à plateia e ao ouvir os sons de admiração, aplausos. O problema é que, sempre que se têm um pouco mais, é impossível não desejar um pouco mais.

O local é o mesmo do ano passado e não surte efeito qualquer sobre meu estado. Matteo me acompanha até o camarim, e pergunto por Eric.

– Já está na antessala, para a apresentação.

Checo o horário no relógio dependurado na parede, me atrasei, no fim das contas. Deixo o casaco e confiro a maquiagem, um minuto depois estou seguindo Matteo até o local de nossa apresentação.

Não estamos na mesma sala redonda em que nos apresentamos no ano passado, mas sim, em um terraço, com luzes bruxuleantes e amareladas refletindo no brilho das roupas esvoaçantes. Sou a única a vestir-me completamente de preto, inclusive a máscara que me foi deixada no carro. Todos, vestidos em tons claros… a não ser o homem parado à minha frente, à distância. Usa o negrume do céu.

O sorriso que vejo não me deixa dúvidas de quem é.

Se quiser ouvir a música enquanto lê, clique aqui.

Antes mesmo que a melodia feroz comece a soar, a ausência de som se faz presente e, como numa cena clichê de filme romântico ou quando olhamos fixamente por muito tempo para um ponto exato e a visão começa a embaçar os excessos em volta, tudo que vejo é ele.

Movendo-se com a música, ele avança. Espero sua investida. É ele o caçador e eu a presa, invertendo os papeis que atribuí há um tempo que agora parece longínquo. Não preciso de passos ensaiados, ou qualquer outra coisa. Basta sentir a melodia que ressoa tão bem no descampado, segui-lo e, então, me afastar. Deixar-me ser pega para novamente me libertar. E de novo e de novo

Seu toque se encaixa como peças de quebra-cabeça ao meu corpo, seus passos são respondidos e seguidos pelos meus quase como se eu quem decidisse a direção. Somos uníssono quando a música atinge seu tom melancólico.

O cheiro que exala me inebria, seu olhar retém o meu, como se fios invisíveis os conectasse.

E, quando paramos, bruscamente, junto ao encerramento da música, meus ouvidos estão tapados à balbúrdia externa. Só ouço a batida forte do meu coração ecoando em meus tímpanos e o ribombar que o dele faz na palma da minha mão, repousada em seu peito.

Não sei se depois de um segundo ou muitos deles, suas mãos seguem para minha cintura, mantendo nossa proximidade. Corto as linhas entre nossos olhares com um piscar e observo ao nosso redor. O local está vazio, completamente à nossa mercê, também como da última vez.

– Esperando por uma dança privativa? – Minhas palavras cortam o silêncio como navalhas em pele fina.

– Quero jantar você, Giovanna. – A fala me faz rir. – Com você… – Ele corrige, mais por convenção do que vontade.

– Eu poderia pensar em um milhão de coisas que quero fazer com você e, sem dúvidas, jantar não está nem no top dez.

É a vez de Alex rir, seus dentes alinhados à mostra e sua beleza destacada.

– Ah, o que eu faço com você?

– Comigo? Vai apenas jantar, Alex. Eu disse que poderia pensar em um milhão de coisas, não que iria fazer qualquer uma delas com você. – É claro que estou reforçando essa ideia mais especificadamente para eu mesma.

– Claro, claro. – Estendendo sua mão, me guia até um canto da vasta varanda. Há uma mesa posta, velas, preparadas ao melhor estilo romântico. Alex é romântico, como não percebi isso antes?

Sento-me na cadeira que ele puxou e em pouco tempo estamos sendo servidos. Tudo como manda a praxe, entrada, prato principal… acompanhados de um silêncio saboroso. Devoramos a comida para não devorarmos um ao outro.

Finalmente, ficamos à sós… o que me faz lembrar que minha estadia já se alongou mais do que deveria. Preciso ir embora antes que cogite sucumbir aos meus desejos mais inóspitos.

– Giovanna! – Deixo claro meu intuito ao me levantar assim que somos deixados realmente a sós.

– Alexandre, não faça isso, você não tem esse direito! – As palavras voam até ele, que repousa as mãos em meus ombros e logo as faz subir até o encontro do meu pescoço. Pele na pele, roçando, fazendo a minha eriçar, arrepiar, suspirar…

– Não quero fazer nada que você não queira, Gio. Apenas diga que não se sente minimamente como eu, antes de ir… por favor… – É ele agora quem corta a linha que prende nosso olhar com suas pálpebras.

Esse é um jogo bem sujo. Ele sabe que não sou dada a palavras ao vento, a dizer inverdades apenas para agradar. Ou para negar algo que sei não ser correto. Quem disse que nossos desejos são sempre guiados pelo condão de certo e errado?

– Sabe que não posso dizer…

Seu ofegar chega até meus lábios, sua testa se ampara na minha e me permito segurar as lapelas de seu casaco, sem ao certo saber se irei empurrá-lo ou trazê-lo para mais perto.

– Tudo que eu te peço, Gio… Hoje, essa noite, agora. – Sua voz treme, mas não tem nada a ver com a brisa fria que passa ao nosso redor.

Talvez não seja tão difícil decidir algo quando os próprios dias podem ser chamados por um dos mais corriqueiros pecados capitais. Um dos que gosto de me esbaldar uma vez ao ano. Um único dia, em que absolutamente tudo é permito em uma ode ao carnis levalle.

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  • MinorKisses

    Muitos parabéns pela sua escrita. É envolvente e sedutora.
    Acho que um dia terá um livro escrito e muito bem escrito!
    Parabéns!

    responder
    • Retipatia

      Oie!
      Own, obrigada, feliz que tenha achado a escrita envolvente e sedutora, combina com o tom do conto! <3
      Obrigada pela visita! <3
      xoxo

      responder
  • Caroline

    Olá!!
    Nossa seu conto ficou muito bom parabéns e continue assim!

    responder
    • Retipatia

      Oi Caroline!
      Obrigada, feliz que tenha gostado!!! <3 <3 <3 E obrigada pela visita! <3
      xoxo

      responder
  • Patricia Monteiro

    Achei o conto muito instigante, o jogo de sedução entre os personagens é sexy e gera curiosidade. Parabéns!

    responder
    • Retipatia

      Oi Patricia!
      Ah feliz em saber que gostou do conto e que essas ideias vieram à mente com a leitura! <3
      Obrigada pela visita! <3
      xoxo

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