
A literatura erótica se encontra para muito além do que muita gente pensa ou imagina ao visitar uma página na Amazon repleta de CEO, milionários e mafiosos: a pluralidade de estilos sempre esteve presente no gênero e aqui você vai ver um pouco da sua história e conhecer uma autora contemporânea que merece destaque no gênero!
A gente sabe que uma boa parte da literatura erótica contemporânea que enche as prateleiras (e, especialmente, as páginas da Amazon) são repletas de realidades que nem todo mundo se identifica: é CEO, bilionário, herdeiro, mafioso e mais um tanto de homi-sarado-perfeito com passado sombrio.
E está tudo bem se você curte eles (quem não quer um milionário sarado e com passado trágico pra chamar de seu de vez quando!? Se for moreno então, a galera vai a loucura!).
O boom da literatura erótica hot de CEO’s e afins

A popularidade de livros de literatura erótica focadas em CEO e afins teve seu boom lá em 2011, especialmente com a repercussão de 50 Tons de Cinza, de E. L. James.
Salvo engano, foi nessa mesma época que o termo literatura hot (quente, em inglês) tomou conta e a palavra erótica caiu quase em desuso entre CEO’s e milionários.
Mas antes disso, em 2005, uma saga que mais parece esquema de pirâmide de tanto livro que tem já estava angariando muitos fãs. Irmandade da Adaga Negra, de Jessica Bird, classificado como romance paranormal, mas que também se enquadra na como ficção erótica.
Um fato interessante é que essa tendência de ficção erótica com o paranormal está ganhando força nos últimos anos. Ou, se não paranormal, atrelada à fantasia e seus subgêneros.
Como referência temos a hype com o livro Noiva de Ali Hazelwood e os lançamentos recorrentes classificados como monster romance: que nada mais é que o interesse romântico por alguma criatura não-humana. Vampiros podem figurar nesse sugbgênero e também estar dentro do erotismo, como nos exemplos que citei.
Porém, a literatura erótica é bem mais antiga que isso e vale entender o panorama de uma forma um pouco mais ampla.
A história da literatura erótica antes da era dos CEO’s e milionários

Dê-me a democracia do toque, a ressurreição do corpo.
O amante de lady chatterley – d. h. lawrence
Podemos começar com obras consagradas como Delta de Vênus de Anaïs Nin da década de 1940. Ou voltar ainda mais tempo com O Amante de Lady Chatterley, de D. H. Lawrence, da década de 1920. Ou, quem sabe, podemos retroceder ainda mais!
No período romano Satíricon de Petronius Arbitrer é considerado um clássico erótico. Da mesma forma, ao longo do tempo, diversos clássicos, ainda que não considerados eróticos, não deixaram de conter cenas eróticas em suas narrativas.
De referência, é possível citar Dom Quixote de Cervantes e Ulisses de James Joyce. Há também a presença de erotismo no poema épico Os Lusíadas, de Camões e em O Decamerão, de Boccaccio, proibido em muitos países.
Sadismo e Masoquismo: como surgiram na literatura erótica

O sadismo marcou presença nessa linha do tempo com uma figura que você provavelmente já ouviu falar: o Marquês de Sade. Autor de Justine, Os 120 Dias de Sodoma, Juliette, e outras obras do fim do século XVIII, Sade deu nome ao que conhecemos hoje como sadismo.
É importante lembrar que o marco da obra de Sade não são relações consensuais, já que o sadismo descrito envolve o não consentimento das vítimas para que o prazer, mediante tortura e dor, fosse alcançado.
A gente corta pros dias atuais e só consigo pensar: é dessa fonte que o subgênero dark romance bebe, né!?
Na outra ponta da balança, no final do século XIX, temos A Vênus das Peles, de Sacher-Masoch. O livro retrata o prazer em sentir humilhação (ou em causá-la), de forma consensual, através do casal apresentado na obra. O termo masoquismo vem justamente do sobrenome Masoch.
Literatura erótica (ainda mais) antiga

Voltando mais na nossa linha do tempo, outras obras se destacam por serem conhecidas mesmo por quem não se interessa pelo gênero, como o Kama Sutra.
O Kama Sutra é um texto indiano que data do século III d.C. Mas o interessante é que, apesar do senso comum, o objetivo nunca foi o de ser um manual do sexo.
Kama é o menor dos três objetivos da antiga vida hindu, subordinado a Darma (vida virtuosa e o maior objetivo) e Artha (acúmulo de riqueza). O livro foi escrito sob o título Vatsyayana Kamasutram (ou “Aforismos sobre o amor, de Vatsyayana”).
Erotismo nos contos de fadas?

Nem os contos de fadas escapam da presença do erotismo. E nem estou falando das recentes versões eróticas dos contos, como a Tetralogia Erótica da Bela Adormecida de Anne Rice (1983). Será que esse tempo todo só trocamos o príncipe pelo CEO na literatura erótica?
Alguns dirão que uma referência de 1983 não pode ser considerada recente… Pois então, vamos lá, de cabeça, um lançamento de 2025, que vi hoje mesmo: Meu Desejo Sombrio de L. J. Shen e Parker S. Huntington, releitura de Cinderella.
O erotismo também pode estar presente no simbolismo e não apenas naquilo que é explícito. E contos de fadas são fontes abundantes de simbolismos. Inclusive, no que toca a forma/idade que donzelas são representadas e como seu amadurecer para a vida adulta surge a partir do encontro com o príncipe.
O debate nesse aspecto é amplo (como tudo que está aqui, na verdade) e a recomendação para quem quer aprofundar é o livro A Psicanálise dos Contos de Fadas, de Bruno Bettelheim.
Literatura erótica: do lirismo aos streamings e ao feminismo

Não vamos nos esquecer dos nem tão antigos assim poemas eróticos de Carlos Drummond de Andrade, que com a publicação de O Amor Natural em 1992, mostrou todo o lirismo que se pode ter nesse departamento.
Nos quadrinhos, no cinema, nos streamings, nas telas de pintura, na música, o erotismo está presente em todos os setores da arte.
Por isso, é sempre bom lembrar que a literatura erótica não se resume a CEO. Muitas obras contemporâneas exploram relacionamentos mais próximos da realidade, de gente como a gente.
Talvez até tenhamos uma ou outra personagem com um passado meio sombrio, mas são sempre histórias mais próximas daqueles causos que estamos habituadas de ouvir e saber, como abandono paterno, chifre e coices que a vida dá.
Como já disse, está tudo bem ler sua literatura erótica com CEO e mafiosos, o ponto aqui é outro. Como todo ramo da ficção, o erótico também é múltiplo e pode ser encontrado em vários formatos, textos, cores, texturas, nuances e extensões (se é que você me entende).
Por isso, existe a ficção erótica considerada feminista, próxima do debate da mulher real, que tem desejos e não é apenas objeto de um desejo 24h/7. É também uma literatura erótica que vai buscar uma representação mais realista do sexo.
E não que a literatura hot dotada de um CEO não possa ser feminista. Afinal, as camadas de debate sempre podem ser exploradas, tenha a narrativa o fator bilionário-mafioso-gostoso envolvido, ou não.
Recomendações da literatura erótica sem CEO, mafiosos e milionários
Para falar de narrativa mais gente como a gente – com saldo bancário sem números exorbitantes e com encontros e cenas menos performáticas – a gente tem muita literatura incrível por aí.
Se você quer conhecer mais do gênero e se aventurar a ver vidas mais próximas da sua em personagens perfeitamente imperfeitas, que não deixe de ler por falta de recomendações!
Aqui temos duas com Selo Retipatia de Qualidade:
Uma leitura de 2020 que tem resenha aqui no blog e que ainda guardo na memória é Digo te amo pra todos que me fodem bem. O livro físico você encontra na Quintal Edições e o e-book, na Amazon:

Digo te amo para todos que me fodem bem
- Autoria:
- Seane Melo
- Ano de lançamento:
- 2019
- Editora:
- Quintal Edições
Fugindo da puta e da santa, estereótipos que predominam na literatura erótica, nesta sua primeira narrativa longa, Seane busca um lugar pra chamar de seu no erotismo, passeando pelo tema da sexualidade com mais dúvidas do que certezas.
Ao recontar suas experiências com João, Mateus e Thiago – num formato que, aí sim, se assemelha a um clássico da literatura erótica: o diário – Vanessa dialoga com produções que se arriscam pelas relações amorosas contemporâneas e exploram em maior ou menor dose a transitoriedade e instabilidade das relações atuais.
A segunda recomendação, também de Seane Melo, é Migalhas, que em breve será lançado pela Editora Patuá.
A leitura dessa obra foi um deleite que mesclou em si sorrisos e amargos da vida (e muitos pães, importante ressaltar). Além isso, foi um caminho maravilhoso para revisitar a sempre muito fluida e deliciosa escrita de Seane:

Migalhas
- Autoria:
- Seane Melo
- Ano de lançamento:
- 2024
- Editora:
- Independente
Elvira acaba de desembarcar em Niterói, onde divide apartamento com uma amiga para cursar um doutorado. Contra suas expectativas, a tal amiga, antes próxima e agora quase uma estranha, não ajuda nada no esforço de Elvira para lidar com a solidão da vida nova. Tudo muda de figura quando, em um aplicativo de relacionamento, ela conhece Beto, um estudante de gastronomia em quem encontra um acolhimento especial. Quando Beto some sem qualquer aviso, Elvira não está disposta a aceitar o silêncio imposto pelo rapaz: por meio de uma comunicação unilateral que dura meses, a estudante mergulha na própria solidão e acaba encontrando pistas de outro desaparecimento que recusa a admitir.
Quem é Seane Melo?
A autora maranhense Seane Melo é também jornalista e já atuou como analista de redes sociais, assessora de imprensa e em diversos projetos de criação literária.
Seu primeiro romance, Digo te amo para todos que me fodem bem, foi lançado em 2019 pela Quintal Edições. Mas antes disso, Seane já havia se aventurado com a publicação independente.
Foi com essas primeiras publicações que Seane se viu como uma escritora de literatura erótica, gênero pelo qual tem apreço desde 2013.
Na sua bagagem, ela traz também os cursos e metodologias de escrita erótica que criou e ministrou e a participação na antologia O Corpo Desvelado – Contos Eróticos Brasileiros (1922-2022). Este último com organização de Eliane Robert Moraes, pela Cepe Editora.
Enquanto cursa Pós-Gradução em Escrita Criativa no NESPE, Seane segue escrevendo suas histórias. Além disso, seu livro Migalhas em breve será publicado pela Editora Patuá e você pode conferir mais obras e informações no site oficial da autora.
Fontes Companhia das Letras | Revista Bula | Wikipédia | AzMina
Luly Lage
Menina, você me lembrou aqui que tô com O Amor Natural há Eras no carrinho da Amazon e nunca compro… Talvez seja a hora de mudar isso…
Sempre falo da Seane quando penso em literatura erótica porque ela foi a primeira que li que consegui acreditar no que estava escrito, e foi uma porta de entrada pra outros livros que apareceram como indicados pra mim sempre terminei os dela e que também não envolviam CEOs e garotas frígidas que magicamente se tornam vorazes quando transam com eles… Mas aqui, lendo seu post, sabe no que pensei? Nas “Sabrinas” e outros romances com nomes femininos que eram vendidos em bancas de jornal (quando elas ainda vendiam jornal).
Talvez esse seja o maior marco da literatura erótica de todos, fico pensando em quantas mulheres sem nenhum incentivo à leitura passou a ler por causa delas!