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A Diferença Invisível ♥ Mademoiselle Caroline & Julie Dachez

Resenha da HQ A Diferença Invisível de Mademoiselle Caroline & Julie Dachez, publicada no Brasil em 2017 pela Editora Nemo, abordando o tema autismo.

A HQ A Diferença Invisível lança algumas perguntas ao leitor: o quanto algo invisível pode interferir em quem somos? Ou mesmo em como nos relacionamos com as outras pessoas e aqueles ao nosso redor? Interfere também em como as pessoas se relacionam conosco? Baseada na história de Julie Dachez a HQ vai traçar uma história realista e sensível sobre autismo e a Síndrome de Asperger.

A Diferença Invisível (La Différence Invisible)
Mademoiselle Caroline & Julie Dachez
Tradução Renata Silveira
Editora Nemo | 2017 | 192p.
Disponível em Amazon
“Acho que chegamos ao ponto em que posso dizer com certeza que Marguerite está cansada. Cansada de ser julgada o tempo todo. Cansada de tentar ser como as outras pessoas. Pessoas com as quais ela se parece por fora, nada mais. Cansada de tudo isso.”
Resenha da HQ A Diferença Invisível de Mademoiselle Caroline & Julie Dachez, publicada no Brasil em 2017 pela Editora Nemo, abordando o tema autismo.
Sobre Mademoiselle Caroline & Julie Dachez

Julie Dachez é diagnosticada com um tipo de autismo (a síndrome de Asperger) aos 27 anos. Uma descoberta tardia, a qual transforma num trampolim para uma nova vida: ela para de se forçar a aceitar um cotidiano que não é para ela e decide viver plenamente com suas forças e suas fraquezas. Em A Diferença Invisível, Julie conta seu percurso, mas também fala de diferenças – no sentido amplo do termo -, de respeito, de tolerância e de auto aceitação. Encontre-a no blog, Émoi Émoi Et Moi, acompanhado por autistas e profissionais da saúde.

Mademoiselle Caroline nasceu em Paris e vive na Haute-Savoie. É autora de vários álbuns humorísticos e autobiográficos, como Quitter Paris e Je commence lundi. Em 2013 publicou Chute libre, um relato sobre suas três depressões, que suscitou um grande interesse da mídia e dos leitores. E em 2015 lançou a adaptação em quadrinhos, Touriste, do livro homônimo de Julien Blanc-Gras.

Sinopse de A Diferença Invisível

Marguerite tem 27 anos, e aparentemente nada a diferencia das outras pessoas. É bonita, vivaz e inteligente. Trabalha numa grande empresa e mora com o namorado. No entanto, ela é diferente. Marguerite se sente deslocada e luta todos os dias para manter as aparências. Sua rotina é sempre a mesma, e mudanças de hábito não são bem-vindas. Seu ambiente precisa ser um casulo. Ela se sente agredida pelos ruídos e pelo falatório incessante dos colegas. Cansada dessa situação, ela sai em busca de si mesma e descobre que tem um Transtorno do Espectro Autista – a síndrome de Asperger. Sua vida então se altera profundamente.

Resenha da HQ A Diferença Invisível de Mademoiselle Caroline & Julie Dachez, publicada no Brasil em 2017 pela Editora Nemo, abordando o tema autismo.
A Diferença Invisível: a história de Marguerite
“A síndrome de Asperger é uma forma de autismo caracterizada por dificuldades de interação e de comunicação e por interesses específicos.”

Quando Marguerite diz que não está dando conta ou que não aguenta uma situação, um acontecimento, o que ela costuma ouvir é já disco arranhado: você precisa se esforçar, se adaptar, basta querer. Mas será que é assim mesmo que as coisas funcionam?

Marguerite está passando por situações rotineiras que a tiram do prumo, um evento social que ela não queria ir, o barulho intenso do trabalho com espaços conjugados, um convite fora do programado. Ela gosta de rotina, ela lhe traz segurança, mostra que as coisas podem seguir um rumo certo e que ela pode se refugiar nas coisas as quais ela gosta.

Quando a situação está insuportável, ela parte em busca de respostas. Será por que ela não consegue se adequar? Por que tudo parece muito mais difícil para ela? Algumas pesquisas na internet a levam à uma ideia inicial, uma palavra que ela jamais imaginou: autismo. Mas será que ela é autista?

Assim, Marguerite parte em busca de mais informações, de um posicionamento especializado, algo que possa ajudar. E, quando ela recebe o diagnóstico, a vida muda. Acima de tudo, para melhor.

A Diferença Invisível: a história de Julie e tantas Marguerites do mundo

A HQ conta com roteiro de Julie Dachez, adaptado por Mademoiselle Caroline, que é também a desenhista. Apesar da personagem principal ganhar outro nome, a história é autobiográfica e, através de Marguerite, conhecemos a trajetória de Julia. Dessa forma, são explorados vários pontos importantes que falam muito sobre o autismo, rebatendo mitos e estigmas.

Um dos primeiros pontos é ver que Marguerite é diagnosticada apenas aos 27 anos. Não é que ela não tenha procurado médicos ao longo de sua vida. Mas o autismo têm uma grande dificuldade em ser diagnosticado, especialmente quando se trata de mulheres, uma vez que os sintomas mais conhecidos, não são os mesmos nos homens, que têm uma proporção maior de casos. Segundo a própria HQ, é de 1 mulher a cada 4 homens. Além disso, as mulheres conseguem se adaptar mais facilmente do que os homens e, por isso, a dificuldade em serem diagnosticadas é amplificada.

Resenha da HQ A Diferença Invisível de Mademoiselle Caroline & Julie Dachez, publicada no Brasil em 2017 pela Editora Nemo, abordando o tema autismo.

A história de Marguerite mostra sua persistência diante da descrença daqueles ao seu redor, desde relacionamentos íntimos à profissionais. Aliás, sem contar os profissionais da área da saúde que também são desinformados, preconceituosos e tentam tirar sua credibilidade. Mas, quando Marguerite enfim recebe o diagnóstico, é como provar a liberdade. É provar a existência de uma peça que ela sempre soube existir, ainda que não pudesse vê-la ou mostrar a alguém.

É bom dizer que, como a própria história mostra, o diagnóstico pode ser encarado de diversas formas, e isso depende de cada pessoa. Ainda assim, não deixa de ser um acalento acompanhar Marguerite e, com ela, ver que a vida pode ser bem melhor, mais confortável. Que a vida tem espaço sim para ela, do jeito que ela é.

A Diferença Invisível: preconceito e senso comum

Não vamos fingir que eu e você nunca julgamos alguém na vida. Embora o mundo esteja em constante mudança, as expectativas das pessoas acerca das outras pessoas costuma seguir certos moldes: no ambiente de trabalho, você deve ser de tal forma; em casa, dessa; com amigos e nas festas, daquele; e por aí vai…

Mas e quando alguém não se encaixa, o que acontece? Provavelmente será vista como antissocial, chato quem sabe, fechado demais… esnobe? A pressão para se adequar é enorme. Mas e quando isso não é algo que você pode alcançar com um pouco de esforço? E quando não se trata de simplesmente se abrir mais?

Resenha da HQ A Diferença Invisível de Mademoiselle Caroline & Julie Dachez, publicada no Brasil em 2017 pela Editora Nemo, abordando o tema autismo.

A melhor comparação que Marguerite faz ao ouvir que esse tipo de coisa acontece com todo mundo, é simples e eficaz: “Você diria a uma pessoa asmática: ‘ah mas quando corro eu também fico sem ar’?”. Não se trata de um comparativo de que todas as pessoas estão sujeitas a sobrecargas, estresse e dificuldades. Não estamos falando do ambiente ou da situação à que as pessoas com Transtorno do Espectro Autista estão sujeitas, e sim de sua condição, que está relacionada ao seu desenvolvimento neurológico.

No meio disso tudo, a palavra preconceito não precisa ser escrita, mas se mostra de várias formas: desde o senso comum, muitas vezes disseminado pela mídia como em filmes como Rain Man e Código para o Inferno; somados à falta de informação. E é bom lembrar que a questão ultrapassa a ideia de empatia para com o próximo, é também sobre respeito e a necessidade de se livrar da ideia de que você pode até ser você mesmo, desde que seja do jeito que nós queremos, o jeito normal. Mas afinal, o que é ser normal?

Resenha da HQ A Diferença Invisível de Mademoiselle Caroline & Julie Dachez, publicada no Brasil em 2017 pela Editora Nemo, abordando o tema autismo.
A Diferença Invisível: a teoria das colheres

Uma das coisas incríveis que A Diferença Invisível cita é a Teoria das Colheres de Christine Miserandino. Ela busca exprimir a sensação de uma pessoa com alguma doença ou condição têm em comparação a alguém saudável. Miserandino queria explicar à sua melhor amiga como era viver com lúpus, isto é, explicar algo que era difícil até mesmo para ela compreender.

Miserandino pegou 12 colheres e entregou à sua amiga. Quando se é saudável, você tem um estoque praticamente ilimitado de colheres para gastar ao longo do dia, de fato, você nem fica pensando em como e quando vai gastá-las. Já quem tem alguma condição ou doença, como Miserandino com o lúpus e Marguerite com a síndrome de Asperger, esse estoque é limitado.

Acordar, tomar banho, lavar o cabelo. Isso pode te levar 2 colheres. Preparar o café da manhã, tomar o café da manhã, cada pequena coisa te leva mais 1 ou 2, às vezes mais. Aquelas 12 não parecem uma quantidade razoável. E isso significa não apenas que as pessoas como Marguerite, Julie e Miserandino precisam ficar atentas a quantas colheres têm para gastar naquele dia, mas também que precisam escolher em quais coisas irão gastar suas colheres. Almoçar com o pessoal do trabalho ou ter energia para fazer o jantar, sair depois do trabalho, ou conseguir voltar para casa?

Além disso, a Teoria das Colheres, através de um comparativo de fácil de compreensão, fala de limites e, especialmente, de respeito à esses limites. É um processo importante e que precisa ser compreendido não apenas por quem tem que economizar suas colheres, como por aqueles ao seu redor.

Resenha da HQ A Diferença Invisível de Mademoiselle Caroline & Julie Dachez, publicada no Brasil em 2017 pela Editora Nemo, abordando o tema autismo.
A Diferença Invisível: leia!

Acompanhar a jornada de Marguerite é mais do que ler sobre uma personagem que passa a se conhecer e aceitar depois do diagnóstico da síndrome de Asperger. Ela vai além, porque lembra como muitas vezes é fácil se esquecer dos limites alheios, como é fácil considerar que todos possuem o mesmo ritmo, que todos devem se ajustar e dar conta. A maré do mundo rema nesse sentido, geralmente passando por cima de quem não consegue acompanhar. Mas existem as vozes, como a de Marguerite e a de Julie, que estão dispostas a ajudar e incluir, a desmitificar e conscientizar.

Se acaso você já passou por alguma doença que limitou seu número de colheres, ou se você está saudável, ou mesmo se tem alguma condição ou não, A Diferença Invisível vai falar com você sobre a importância do respeito e acolhimento às diferenças e às necessidades de cada um. A inclusão de que precisamos é a de aprender, em todos os aspectos da vida, a respeitar os limites e as diferenças. Nossas e dos outros.

Resenha da HQ A Diferença Invisível de Mademoiselle Caroline & Julie Dachez, publicada no Brasil em 2017 pela Editora Nemo, abordando o tema autismo.
Aleatoriedades

Para quem quiser ler mais sobre autismo, do ponto de vista do autista, recomendo Na Montanha-Russa: vivendo a maternidade no autismo da Michelle Malab. Como é citado em A Diferença Invisível, o diagnóstico em mulheres costuma ser tardio devido à sua maior capacidade em disfarçar suas dificuldades, então muitas descobrem a condição apenas quando os filhos são diagnosticados. E aliás, esse é o caso de Michelle Malab, que traz um relato sensível e sincero em seu livro.

2 de Abril é o Dia Mundial de Conscientização do Autismo e foi criado pela Organização das Nações Unidas em 2007, para que seja dada visibilidade pela mídia e sociedade ao Transtorno do Espectro Autista. Em vários países, na data, monumentos são iluminados na cor azul; no Brasil, a campanha nacional criou para 2020 e 2021 um tema único, sob o título Respeito para todo o espectro. Saiba mais em Revista Autismo.

Para quem quiser conhecer mais sobre a Teoria das Colheres, o artigo original de Christine Miserandino pode ser visto aqui, além disso, encontrei uma tradução em português de Portugal no site da Associação Portuguesa de Fibromialgia que pode ser lido aqui.

Que a Força esteja com você!

xoxo

Retipatia
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  • Angela Cunha

    Eu vim correndo saber sobre a Graphic e claro, sobre a teoria das colheres e para aprender mais sobre esse tema, sobre essa vida que que precisa ser respeitada e amada, muito amada!
    Adorei as cores e com certeza, preciso viver esse mês com mais saber!!!
    Beijo

    Angela Cunha/O Vazio na flor

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