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A Noite dos Mortos-Vivos ♥ Istin & Bonetti

Resenha comparada da HQ A Noite dos Mortos-Vivos, de Istin & Bonetti com o filme de mesmo nome que a inspirou, de George Romero, à luz das análises do livro Horror Noire.

Você pode até não ter assistido ao clássico do cinema A Noite dos Mortos-Vivos de George A. Romero, mas pode ter certeza que, sem ele, não existiriam os filmes, HQ’s, livros e tantas outras histórias com zumbis. E a HQ de Istin & Bonetti traz uma releitura contemporânea imperdível do clássico das telonas.

A Noite dos Mortos-Vivos (La nuit des morts vivants)
Jean-Luc Istin & Elia Bonetti
Tradução Paulo Henrique Tirre
Mythos Editora | 2020 | 172p.
Disponível em Amazon
“Você tem medo da morte?”
Sobre Jean-Luc Istin & Elia Bonetti

Jean-Luc Istin é um autor de quadrinhos nascido em 1º de agosto de 1970, em Pontivy. Designer e roteirista, é diretor de várias coleções na Éditions Soleil Productions, como a Soleil Celtic, 1800 , Serial KillerSecrets du Vatican e a Antecipation. Pela Editora Mythos, tem publicado no Brasil, além de A Noite dos Mortos-Vivos a série Soleil (Elfos, Anões, Orcs, Crônicas de Excalibur).

Elia Bonetti nasceu em 20 de outubro de 1983 em Parma, Itália. Elia sempre soube que queria ser artista, tendo sido educado na Art and the International School of Comics em Florença, Itália. Uma de suas obras mais conhecidas é Star Wars: Darth Vader: Dark Lord of the Sith.

Resenha comparada da HQ A Noite dos Mortos-Vivos, de Istin & Bonetti com o filme de mesmo nome que a inspirou, de George Romero, à luz das análises do livro Horror Noire.
Sinopse de A Noite dos Mortos-Vivos

No Halloween, Lizbeth deixa o marido e os filhos para acompanhar seu irmão, Leland, na visita sacrossanta à sepultura onde seus pais adotivos estão enterrados. Mas, ao chegarem ao cemitério, eles são atacados por um grupo de mortos-vivos! Depois de uma longa perseguição, Lizbeth e Leland encontram refúgio em um hotel que provará ser a única barreira contra uma horda de zumbis ansiosos por carne fresca, pois a epidemia se espalhou e várias grandes cidades já estão devastadas. Lizbeth não tem certeza se poderá encontrar seu marido e filhos vivos…

A Noite dos Mortos-Vivos é um dos maiores clássicos do cinema, responsável por praticamente criar o gênero de horror zumbi. A obra foi reinterpretada para os quadrinhos por Jean-Luc Istin, o criador da renomada série Elfos! Ao fazer essa versão moderna de ‘A Noite dos Mortos-Vivos’, Istin e Bonetti imprimiram um ritmo frenético, marcado também por um visual de blockbuster, mas sem deixar de explorar de forma profunda o perfil dos personagens.

A Noite dos Mortos-Vivos: a história da HQ adaptada do filme clássico de Romero

Após deixar o marido e os filhos em casa para viajar até o túmulo dos pais adotivos junto de seu irmão Leland, Lizbeth não imagina que irá se deparar com uma figura estranha que tenta atacá-la. A situação foge de controle quando mais dessas pessoas que parecem querer devorá-los aparecem aos montes. Com sorte, os irmãos conseguem escapar, mas está claro que tem algo muito errado acontecendo. Buscando por abrigo, eles acabam indo parar em um hotel de luxo que parece estar a salvo das criaturas.

De outro lado, logo que sua esposa Lizbeth parte em viagem, John se depara com uma horda de zumbis invadindo a região. Em fuga com os filhos pequenos, ele vai em busca de um reencontro com Liz e, ao mesmo tempo, a segurança da família.

Além da divisão da história para que acompanhemos Lizbeth e Leland de um lado e John e os filhos de outro, ainda temos um vislumbre de um laboratório de pesquisas onde, como é de se imaginar, algo deu muito errado. E esse ponto é uma chave interessante para o que a história irá explorar para além da história originária de George Romero: aqui, teremos uma amplitude dos acontecimentos, a identificação de onde veio o caos que tirou a vida de milhares e os transformou em máquinas comedoras de cérebros. Um ponto inclusive bem elencado na história, que já traz a possibilidade de vir por aí muito mais história de zumbi.

Resenha comparada da HQ A Noite dos Mortos-Vivos, de Istin & Bonetti com o filme de mesmo nome que a inspirou, de George Romero, à luz das análises do livro Horror Noire.
Os personagens da GN A Noite dos Mortos-Vivos: ecos dos personagens do filme?

O cenário da graphic novel A Noite dos Mortos-Vivos é aquele apocalíptico que todo fã de terror zumbi já está acostumado: qualquer deslize pode te transformar em um morto-vivo. Em meio ao caos, somos apresentados aos personagens e, de certa forma, tomando partido aqui e ali. Já que, como todo bom terror zumbi, o lembrete de que o pior monstro é o ser humano, também está presente.

Pensar na graphic novel A Noite dos Mortos-Vivos sem relacioná-la à obra a qual se inspirou, o clássico filme A Noite dos Mortos-Vivos, de George Romero, é tarefa impossível para quem já tenha visto o filme, ainda que há muito tempo. Vislumbrar os personagens da GN sem vê-los como ecos da obra originária é uma tarefa hercúlea, mas ainda assim, é possível fazer observações acerca das figuras que se apresentam na trama contemporânea, sem se vincular ao filme.

Resenha comparada da HQ A Noite dos Mortos-Vivos, de Istin & Bonetti com o filme de mesmo nome que a inspirou, de George Romero, à luz das análises do livro Horror Noire.

Temos na história personagens de todos os tipos de índoles. Aqueles capazes de tudo para salvar a própria pele, os altruístas, os aproveitadores e por aí vai. Lizbeth e seu irmão conduzem o fio central, mas também nos permitem conhecer os outros hóspedes do hotel tal qual o são. Por exemplo, o bufão gerente do Hotel, na gana sádica de proteger a família a todo custo, se mostra alguém totalmente contraditório, mesquinho. A melhor definição seria um completo babaca.

Ao mesmo tempo, algumas outras personagens surgem com novos pontos de debate, como Mandy, uma mulher que sofre de doenças mentais e reflete o lado mais primitivo do ser humano. Mas temos também figuras feitas para se apegar, não apenas com John e seus filhos, que acabam em situações estarrecedoras, como Téo, o garotinho que também está refugiado no Hotel.

A GN A Noite dos Mortos-Vivos: expandindo o universo do filme de Romero

O caos que a situação do Hotel urge em representar é como uma réplica da sociedade em que vivemos. Aqueles com poder pisam sobre os que não o possuem. A própria sobrevivência é desculpa para deixar com que outros pereçam e, aqui, em modo literal. Essa é uma dinâmica herdada do próprio filme de Romero. A disputa pelo poder, pela tomada de decisões, pelo controle. a necessidade de entender apenas as próprias decisões como válidas, seguras e aceitáveis.

A trama criada por Istin, unida à arte de Bonetti traz um espetáculo e tanto para a HQ. Não apenas os desdobramentos são interessantes e prendem a leitura, como traz a sensação de estamos assistindo a um filme de zumbis, com a trama encorpada para com os desfechos e previsões possíveis dentro do arco geral já ditado pelo filme A Noite dos Mortos-Vivos.

Mas quando se trata de pensar em semelhanças e diferenças das histórias de cada mídia, vale também levantar algumas outras questões.

Resenha comparada da HQ A Noite dos Mortos-Vivos, de Istin & Bonetti com o filme de mesmo nome que a inspirou, de George Romero, à luz das análises do livro Horror Noire.
A HQ e o filme A Noite dos Mortos-Vivos: semelhanças e diferenças

O contexto geral do filme A Noite dos Mortos-Vivos está presente em uma das visões que são apresentadas na graphic novel: a luta pela sobrevivência que se dá na pequena casa no longa, foi levada para um Hotel. Já a luta de John para sobreviver com os filhos em meio ao caos, traz um panorama amplificado sobre o que está acontecendo no mundo, diferenciando-o do filme, já que nele o tema acaba restrito à avisos televisivos aos quais os personagens conseguem assistir e através do qual é revelado que a possível causa do surto é um experimento científico que saíra do controle.

Aproveitando essa deixa, da então inovação de Romero ao colocar a culpa do surto em experimentos científicos, a graphic novel traz uma amplificação dessa ideia, explorando o que poderia ter acontecido nesses experimentos e criando um background para a história. E, ao mesmo tempo, como já citei, criando a ideia de que muitos desdobramentos ainda podem vir após o último capítulo.

Resenha comparada da HQ A Noite dos Mortos-Vivos, de Istin & Bonetti com o filme de mesmo nome que a inspirou, de George Romero, à luz das análises do livro Horror Noire.

Um outro olhar interessante é a mudança que se tem no papel de Lizbeth, Barbara no filme. Enquanto no longa de Romero a personagem feminina se transforma após o ataque em um receptáculo vazio, estando em algo semelhante à um estado catatônico durante todo o filme, Lizbeth é alguém que, mesmo diante da situação desesperadora, consegue agir, lutar por sua vida e de outros.

Contudo, enquanto o papel feminino ganhou uma nova roupagem, não apenas de destaque, como de figura ativa na trama, o debate racial que existe no filme de Romero ficou de lado. Ou melhor, é completamente inexistente.

Resenha comparada da HQ A Noite dos Mortos-Vivos, de Istin & Bonetti com o filme de mesmo nome que a inspirou, de George Romero, à luz das análises do livro Horror Noire.
A Noite dos Mortos-Vivos & Horror Noire

Segundo Robin R. Means Coleman, no seu livro Horror Noire: a representação negra no cinema de terror (2019 | DarkSide Books), George Romero, assim como os realizadores do filme, afirmavam que não houve o intuito de trazer um debate racial para a história através do protagonismo de Ben, vivido pelo ator Duane Jones, o único negro que aparece em A Noite dos Mortos-Vivos.

Ainda assim não significa que o filme não veio carregado de significados e, também, que o público não tenha feito tais análises. A mensagem do filme de Romero, como destaca Coleman, indicando também o momento histórico pelo qual os Estados Unidos estavam passando, com o movimento dos Direitos Civis e o Nacionalismo Negro, destacava o “desamparo social, político e econômico dos negros, e a vitimização violenta era uma história terrível da qual era difícil escapar.” (201p).

Resenha comparada da HQ A Noite dos Mortos-Vivos, de Istin & Bonetti com o filme de mesmo nome que a inspirou, de George Romero, à luz das análises do livro Horror Noire.
“Pouco importa se os realizadores de Noite estavam escrevendo propositalmente ou de forma velada uma mensagem racial; o que se leva da história é o que importa.” (Coleman em Horror Noire, 201p)

Fato é que a figura de Ben, junto com o debate racial foi extirpada da graphic novel de Istin e Bonetti. O que é, minimamente, um contrassenso, já que a presença do tema é apontado por Coleman como um dos responsáveis pelo sucesso do filme nas telas de cinema na época de seu lançamento, em 1968, com o apoio que o filme recebeu da população negra. Por último, é bom destacar que a HQ também carece de representatividade negra.

Aleatoriedades

A Graphic Novel A Noite dos Mortos-Vivos foi recebida em parceria com a Mythos Editora.

Antes de mais nada, uma curiosidade aleatória é que foi impossível ler a HQ e não achar o personagem Leland a cara do Nicolas Cage!

E então, por último, mas não menos importante, a recomendação de uma HQ com cenário apocalíptico: Oblivion Song, de Robert Kirkman, Lorenzo de Felici e Annalisa Leoni.

Lembre-se: ao se deparar com um morto-vivo, acerte na cabeça!

xoxo

Retipatia
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  • Paulo Daniel

    Suas postagens são ótimas, estou seguindo seu blog e curtindo bastante!! Parabéns!

    Meu Blog: Lotofácil

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  • Luly Lage

    Eu tô aqui rindo demais da observação sobre o Nickolas Cage no final, hahahaha!

    Enfim, foco! Tem pouco tempo que comecei a achar as tramas de zumbis que gosto, porque na maioria das vezes acho tudo tão visualmente feio (ai, fresca!) que não consigo gostar. Entrei nesse post pensando em só ler, sem comentar, porque não queria falar mal do objeto da resenha, claro, mas achei o traço tão bonito! Gostei! Talvez seria mais uma exceção à minha regra…

    Só é triste tirar justo o personagem que trouxe os debates raciais, né =(

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