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Conto ♥ Vazio |
Leia ouvindo: The Scientist – Coldplay Somos exatamente como eles. Todas as diferenças possíveis, unidas. Não que se reflitam exatamente como nos dois animais que brincam e se deliciam com o sol morno do fim da tarde de outono. Não. Muito provavelmente eles não se sentem tão diferentes assim, o exterior não conta para eles. É como se fossem iguais. E não posso dizer que não o são. Os dois apenas param de brincar quando sua humana recolhe o cobertor em que estava sentada e segue para fora da grama, chamando-os. Várias pessoas estão começando a deixar o parque. O vento está ficando mais forte com a noite se aproximando e meu terno não é suficiente para espantar o frio. Cruzo meu braços e recosto no banco, não consigo pensar em voltar para casa ou para qualquer outro lugar. Não tenho mais lar, o local que comecei a sentir como tal, é exatamente aquele para o qual não posso mais retornar. A memória dela está em absolutamente tudo. Até mesmo nos lugares em que nunca esteve, em que nunca a vi, toquei ou senti seu cheiro. Talvez seja eu. Estou impregnado dela ou por ela. Não sei bem definir. O sentimento de perda, ainda que tenha sido eu quem partiu, parece um veneno que foi injetado em minhas veias. E ele é cruel. Corre lentamente, queimando e secando minhas veias, infiltrando-se no meu coração e fazendo-o secar e morrer. Lentamente. Dolorosamente. Fecho meus olhos quando as lágrimas ameaçam retornar. Estou farto delas, não têm o condão de aliviar minha dor ou qualquer outra coisa. No momento, apenas fazem com que eu me sinta pior. Como se cada uma delas representasse cada uma de minhas falhas. – Eles são fofos, acho que você deveria ter um cachorro, ou um gato, Gael. – Sou alérgico, você sabe disso. – Respondo, não ousando abrir meus olhos. O som da voz dela já é o suficiente para que me sinta reconfortado. Um calor, que não combina com a temperatura que continua caindo, ou com os ventos que agora estão ficando intensos e mais gélidos, parece me abraçar. – É claro que sei, só queria uma desculpa para puxar assunto. – Não preciso abrir os olhos e virar para ela para saber que está sorrindo ao dizer essas palavras. – Você não precisa de desculpas, nunca precisou. – Sei disso. Mas achei que chegar e dizer que vê-lo assim corta o meu coração seria… não sei, estranho, talvez. – Não seria estranho se fosse você a dizer. – É, mas ainda mantenho a ideia do cachorro. – Um leve riso está na sua voz e é impossível que eu também não sorria. Os minutos se alongam e me contento com sua presença, porque, imagino que enquanto ela durar, não haverá dor, tristeza ou solidão. Somos apenas eu e ela. – Eu fui um completo idiota ao dar ouvidos às suas ideias. – Não estou reclamando ou muito menos xingando. É um desabafo e ela sabe disso. – Não, não foi. Nunca se é idiota por acreditar no amor, Gael. Nunca. Eu rio agora, mas estou vazio, assim como o som que me escapa. – Claro. – Não consigo evitar o sarcasmo ao respondê-la. – Não seja irônico comigo. – O tom na sua voz é...
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