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Coroa de Leite ♥ Tamilla Moura |
Um murmuro do som do mar que se mistura à velha de suéter vermelho sentada na praça. Um salto fenomenal, um parto de pedra e dias passados a limpo como se nada fosse mudar o aglomerado de gente que só aumenta no terreno invadido. Tudo acontecendo, no seu próprio passo e próprio tempo, nos contos de Coroa de Leite, da Tamilla Moura, publicado pela Quintal Edições. Coroa de Leite Coleção Yebá Autora Tamilla Moura Editora Quintal Edições Sobre a Autora Cresci em uma rua chamada Bom Despacho, em Lagoa da Prata. Me formei em Direito, mas pouco – ou nada – exerço. Quem sabe um dia. Afora os casos que conto, não há muito o que contar. Só sei falar de mim escrevendo sobre os outros. Nem em cem vidas conseguiria dizer o que não entendo da vida. Sinopse O livro de estreia de Tamilla Moura surpreende pela maturidade da escrita. Coroa de Leite é composto por contos equilibrados, em que a potência dos detalhes – entrelaçados com cuidado e sem obviedades – constrói uma unidade que emociona e que incomoda. Se há um fio condutor temático que mantém os textos unidos, este é o fio da rememoração. É na reconstrução de uma memória frágil, porque subjetiva e insólita, que Tamilla desvela a essência cíclica de tudo – da escrita, das coisas, da vida e das pessoas. Relembrar o passado, parece significar, na obra, não só uma oportunidade de reencontro consigo mesmo, mas também o claro desencontro com um outro que já não existe. Infância e velhice se tocam exatamente ali, nessa tensão entre o eu e o outro, e evidenciam a natural proximidade entre os extremos. Coroa de Leite O livro é composto por 13 contos narrados em prosa agradável, com ritmo que varia de um pra outro, de narrador para estado de espírito do personagem. Uns encontram nas razões vazias do passado o sentido do que se têm agora, outros, fazem parte daquilo que relembram, mas, não necessariamente, o fazem para encontrar sentido. A vida não tem que ter sentido o tempo todo, não tem de ter porquê e pra quê, e, cenouras desoladas que o digam. Perece Um Sol de Ida “Coitada, ela não possuía outra saída senão reparar em mim e esfarelar os meus hábitos – inevitável tragédia a qual os convivas estão condenados.” “Isadora era a única no mundo com capacidade de secar um cacto e esmiuçar quem estava na outra ponta da vida – e olha que nem deserto seca cacto.” Carteado “Filha de torneiro, mantinha-se tempos focada nos nós que encarrilhavam eventos, a procurar como funcionavam e por que um corpo e uma perda se aglutinam.” “Minhas constatações sobre o sofrimento, sobre a solidão e sobre o benefício de se sujar uma canastra deram lugar à fervura dos meus nervos e ao descompasso de nossas perspectivas.” “A hipertrofia da felicidade parece ter tirado o foco de minha amiga das coisas que realmente importam: os contentamentos bem ralos, as projeções de meio metro, os sentidos esfumaçados e a relevância de se pegar o morto.” Ora temos o próprio narrador pessoa-coisa-estado-lugar, a nos palavrear em primeira pessoa, ora, em sutil papel de contador de história que só está a observar todo aquele rebuliço das coisas conhecidas e desconhecidas. Uma das perguntas que sempre surgem no...
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